À
Presidenta da República Dilma Roussef
Ao
Ministro de Estado da Educação
Profº Fernando Haddad
Assunto: DEMANDAS POLITICAS DO MOVIMENTO DE CURSINHOS COMUNITÁRIOS – UNEAFRO BRASIL
A UNEafro-Brasil - movimento popular que organiza Cursinhos Comunitários Preparatórios para o ENEM, Concursos e Vestibulares dirigidos à população negra e à classe trabalhadora - surge e atua em defesa da educação pública, gratuita, de qualidade e de pleno respeito à diversidade. Mantemos, cotidianamente, através do trabalho voluntário de centenas de professores e ativistas sociais, 42 núcleos de Cursinhos Comunitários nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia e Pará.
Hoje reunidos na Universidade Federal do ABC, campus de Santo André, estamos nós, professores, ativistas e principalmente estudantes que, através desta, reivindica ações necessárias e urgentes para um país que historicamente condenou a educação pública a completa precarização e negou a ela o teor transformador e libertador que, segundo Paulo Freire - e concordamos com ele, a Educação deveria ter.
Nesse sentido, pontuamos em poucas palavras, mas com a necessária e fraterna contundência, demandas importantes ao nosso Movimento e a todos os estudantes de escolas públicas e de Cursinhos Comunitários do País:
Sobre o combate à miséria
O Brasil recebeu com satisfação e esperança a notícia de que o governo da Presidenta Dilma Roussef vai priorizar o combate à miséria nas ações estatais. No entanto, acreditamos que a superação da pobreza depende, fundamentalmente, do rompimento com os interesses do grande capital, no Brasil representado por latifundiários e empresários do agronegócio, por banqueiros, especuladores financeiros e empresas multinacionais de diversas áreas. Daí porque somente uma mudança estrutural nas relações políticas e econômicas será capaz de eliminar tais desigualdades.
Educação e combate a miséria
A Educação é, sem dúvida, um mecanismo fundamental para a superação da miséria e do racismo que tanto assolam nosso país. Ademais, não há dúvidas quanto ao tamanho do desafio, visto que a Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílios (PNAD) divulgada no final de 2010 apontou que o Brasil possui 14 milhões de analfabetos. E mais uma vez, percebe-se a população negra entre os mais preteridos no acesso a este direito.
Aqueles/as que conseguem superar o analfabetismo encontram inúmeros desafios para completar o ensino médio, ter acesso a cursos técnicos e principalmente às universidades. Mesmo com o advento do PROUNI e o fomento do ENEM enquanto via de acesso mais democrática, as camadas mais empobrecidas da população tem ficado às margens destas conquistas, visto o deficit na preparação prévia adequada.
É justamente a esse desafio que a UNEafro-Brasil se lança, cotidianamente, a partir de um grande e permanente mutirão educacional. Por meio da ação voluntária de centenas de professores, trabalhamos para além das disciplinas da grade oficial, incluindo em nosso curriculo temáticas cruciais da sociedade brasileira atual, como o combate ao racismo e ao preconceito, melhoria da qualidade da escola pública, combate à violência urbana, prevenção ao uso de drogas, protagonismo juvenil, convívio e fomento da diversidade (gênero, etnia, idade, orientação sexual e opção religiosa) e o estudo da história afro-brasileira, compreendida pela lei 10.639/03.
10% do PIB para a Educação Já!
UNEafro-Brasil está ao lado dos movimentos populares que reivindicam o aumento dos investimentos em educação para 10% do PIB. Não é possível imaginar um desenvolvimento sustentável e socialmente justo em uma sociedade que não prioriza a educação, não valoriza professores e não democratiza o acesso. Defendemos uma radical reformulação da educação brasileira, não apenas no que diz respeito aos recursos, mas ao modelo educacional, aos valores e aos métodos. Sobretudo, nos opomos ao modelo neoliberal de educação que, infelizmente, ainda caminha a passos largos em nosso país. Exigimos 10% do PIB para o investimento em uma educação de qualidade, gratuita, popular, laica, antirracista, antimachista e anti-homófobica.
Material didático preparatório para Enem: Público e para livre reprodução
A falta de vagas no ensino superior e a peneira injusta do vestibular nas universidades públicas tornaram os cursinhos comunitários uma realidade em todo o país. Os cursinhos comunitários conseguem desenvolver um ótimo trabalho educacional e de mobilização, mas há o desafio permanente em conseguir um material didático que reúna baixo custo e qualidade.
Dessa forma, a UNEafro-Brasil reitera a reivindicação, já registrada em 22 de Agosto, em audiência junto ao Sr. Ministro da Educação Fernando Haddad, os seguintes pontos:
· Elaboração de Material Didático Preparatório para ENEM e disponibilização do conteúdo para livre reprodução por parte de todos os Cursinhos Comunitários e Populares do Brasil e a elaboração de material para aplicação de Simulados de Exame do ENEM, voltado para alunos destes Cursinhos;
· Disponibilização do mesmo material impresso para os estudantes do 3º ano do Ensino Médio em todo o Brasil;
· Disponibilização deste material impresso, a ser distribuído às redes de Cursinhos Comunitários e Populares devidamente cadastradas no MEC;
Política de Permanência de Negros e Pobres da Pré-Escola ao Ensino Médio!
Sabemos o quanto a evasão escolar incide como um impedimento de desenvolvimento individual, familiar comunitário. Sabemos também o quanto é complexa a realidade ao redor das motivações da evasão escolar. Ainda assim, é possível afirmar que um dos principais motivos de evasão escolar é a necessidade de o jovem conciliar trabalho e estudo. Em especial a jovem negro.
A UNEafro defende a criação de uma Política de Permanência de Negros e Pobres da Pré-Escola ao Ensino Médio. Essa Política deve se inspirar no modelo de política de permanência adotado pelas Universidades Federais, que por meio de bolsas-auxílio, garantem moradia, alimentação e transporte aos estudantes. No caso mais específico, o benefício deve ser ampliado no sentido de garantir que o aluno não seja obrigado a deixar os estudos para ajudar no sustento da família.
LEI 10639 – Um avanço apenas Simbólico
Apesar de ter sido aprovada há oito anos, a Lei 10.639/03 ainda não foi efetivada. O movimento negro tem denunciado o descaso dos sucessivos governos, nos níveis federal, estadual e municipal. A aprovação dessa Lei é uma das poucas vitórias institucionais do movimento negro nos últimos anos. No entanto, o sentimento é de que ganhamos, mas não levamos! A lei não se efetiva, em parte por falta de vontade política dos governos e por outra, pelas ‘desculpas’ de falta de verba pública.
Para além de campanhas e mobilizações de reivindicação pela efetivação prática da Lei 10639 por parte do Estado, entendemos que os Movimentos Populares têm muito que contribuir para a constituição dos materiais pedagógicos e do relato de suas vivencias;
A partir desta perspectiva, a UNEafro produziu um vídeo educativo denominado Juventude Negra: preconceito e morte, onde especialistas, intelectuais e militantes sociais resgatam a história de resistência da população negra escravizada, bem como a herança de descaso e abandono a qual essa população foi condenada nestes 123 anos de pós abolição.
Requeremos que o MEC e, a partir daí, os setores competentes do Governo Federal, adotem essa produção como uma das peças a serem fomentadas como instrumento de aplicação da Lei 10639, dirigidos para a formação de professores e estudantes das escolas públicas em todo país.
Por fim, enfatizamos o momento historico de rediscutirmos o tipo de Educação que o Brasil quer e precisa. A UNEafro-Brasil coloca-se a disposição para essa construção!
Aguardamos.
Cordialmente,
Conselho Geral da UNEafro-Brasil